Medida de Segurança

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HISTÓRICO E CONCEITUALIZAÇÃO

O Decreto-Lei 2.840, de 7 de dezembro de 1940, que instituiu o Código Penal, definiu, aos artigos 26 a 28, sobre a inimputabilidade penal:

       Inimputáveis
       Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.  
     
       Redução de pena
       Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.      
       
       Menores de dezoito anos
      Art. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.     
       Emoção e paixão
       Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal: 
       I - a emoção ou a paixão;


Ou seja, a inimputabilidade é o termo associado ao agente que, ao tempo da infração penal, não tinha o discernimento necessário para compreender a proibição imposta, bem como as consequências de sua conduta. Fator esse que, em tese, exclui a sua responsabilidade sobre os danos ocasionados por seu comportamento.

A determinação da (in)imputabilidade do agente está condicionada a perícia médica a ser realizada por especialista em Psiquiatria, de preferência qualificado em Psiquiatria Forense, geralmente dentro dos Hospitais de Custódia.

A medida de segurança é, então, a providência do Estado imposta ao agente inimputável ou semi-imputável que pratica um fato típico e ilícito, com base no grau de periculosidade do mesmo. Trata-se de toda a reação penal, detentiva ou não detentiva, que se liga à prática, pelo agente, de um fato ilícito típico, tem como pressuposto e princípio de medida a sua periculosidade e visa finalidades de defesa social ligadas à prevenção especial, seja sob a forma de segurança, seja sob a forma de ressocialização.

Pessoas inimputáveis que cometem crimes sofrem sanções penais na forma de medidas de segurança. Embora muitas vezes se mencione que o inimputável não é punido, a medida de segurança – adotada com os objetivos de tratamento e de proteção da sociedade – também pode significar restrição da liberdade, tanto que a sua aplicação, em lugar da pena reservada aos imputáveis condenados, resulta de uma decisão judicial que a doutrina chama de absolvição imprópria (o réu é absolvido, por ser inimputável, mas, reconhecido como autor do crime, será internado em unidade penal especial, isto é, o hospital psiquiátrico de custódia (antigamente denominados "manicômios judiciários").

Nesse artigo, discorreremos acerca da medida de segurança imposta aos indivíduos considerados inimputáveis (Art. 26) ou semi-imputpáveis (parágrafo único do Art. 26) decorrente de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto.


SANÇÕES PENAIS APLICÁVEIS À MEDIDA DE SEGURANÇA

O Código Penal prevê, no artigo 96, duas medidas de segurança aplicáveis a quem praticou alguma conduta criminosa, mas não pode cumprir pena, por ser entendido como inimputável ou semi-imputável:

       Espécies de medidas de segurança
       Art. 96. As medidas de segurança são:  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
       I - Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado; 
       II - sujeição a tratamento ambulatorial.  
       Parágrafo único - Extinta a punibilidade, não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta.
       Imposição da medida de segurança para inimputável
       Art. 97 - Se o agente for inimputável, o juiz determinará sua internação (art. 26). Se, todavia, o fato previsto como crime for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial. 
      
       Prazo
       § 1º - A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos.

Vejamos que o Código Penal define como medidas de segurança a internação em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP) ou a sujeição a tratamento ambulatorial, de acordo com o tipo de delito e o grau de periculosidade do agente.

Importante salientar que os HCTPs não pertecem ao SUS. Tratam-se de unidade prisionais especiais, e, portanto, vinculadas à outras secretarias (p. ex., secretaria de Segurança Pública, Cidadania e Justiça). No estado de Santa Catarina, há alguns anos foi criada a pasta da "Secretaria da Administração Prisional (SAP), que atualmente é quem coordena as unidades prisionais.


QUESTÕES PRÁTICAS

Enquanto não administrados pelo Sistema Único de Saúde, os HCTPs apenas tangenciam a "RAPS" (Rede de atenção psicossocial). Além da finalidade primordial de custodiar os apenados em medida de segurança, os HCTPS Secundariamente, também se prestam ao tratamento de apenados com distúrbios mentais, situação que tende a ser comum dentro das prisões. Por exemplo, no modelo de Sofrimento de Kübler-Ross, o indivíduo passa pelas fases de negação, raiva, negociação (barganha), depressão e aceitação, que são muito comumente observadas nos detentos. Não raro alguns apenados apresentam psicoses, demandando ainda mais tratamento especializado. A própria Lei Nº 7.210, de 11/07/1984 (Lei de execução penal) garante, aos presos, a assistência à saúde em caráter preventivo e curativo.

Tem ocorrido algumas confusões por parte de operadores do Direito acerca da internação para tratamento médico comum com o conceito de medida de segurança. Deve ficar bem claro que a medida de segurança é reservada apenas a situações derivadas de crimes praticados por doentes mentais inimputáveis processados. A Lei 10.216, por outro lado, trata dos "direitos das pessoas com transtornos mentais", ou seja, ela justamente objetiva evitar que sejam cometidas arbitrariedades contra esses indivíduos somente por apresentarem transtornos mentais. Neste sentido, a Lei 10216 define, ao Art 6, sobre as modalidades de internação (voluntária, involuntária e compulsória), que estas sempre serão condicionadas a um laudo médico circunstanciado caracterizando os motivos da internação.

Outra questão bastante problemática ocorre quando o HCTP dá negativa aos operadores de direito em receber um detento com transtorno mental. Na maior parte dos casos, tal negativa se dá após devida avaliação e diligência pelos médicos da instituição, mas por estratégia do advogado se pretende a transferência do apenado para uma instituição de saúde. Neste sentido, importante observar que somente os órgão próprios da Segurança Pública podem dar conta do transporte e dos cuidados do apenado, na forma da lei, não cabendo evocar ou pedir ação amadora e improvisada dos profissionais da saúde para tentarem imitar policiais de qualquer tipo. Para tentar tal empreendimento da melhor forma, precisaria o órgão do SUS fazer uma bizarra licitação (o que toma tempo) com o fim de contratar pessoas da área de segurança capazes de lidar com presidiário perigoso, de forma totalmente alheia aos seus princípios constitucionais e às suas funções oficiais, correndo o risco de glosa e de punição pelo Tribunal de Contas.

Importante apontar que, em Santa Catarina o HCTP recebe apenas indivíduos do sexo masculino. Este fato acaba direcionando tais demandas ao SUS na aplicação a execução de medidas de seguranças em presas femininas. O estado de Santa Catarina, mais especificamente as secretarias que administram o sistema prisional, historicamente nunca organizaram enfermaria feminina em Hospitais de Custódia. Assim as femininas com determinação judicial para cumprir medida de segurança ficam sem um estabelecimento adequado. Isto é bastante problemático, pois tais mulheres terão, em geral, três alternativas: a) tratamento ambulatorial; b) medida de segurança em leito psiquiátrico; c) medida de segurança em prisão comum. A alternativa 'a' não é a mais viável quando se reconhece periculosidade. Vejamos que as duas últimas alternativa, para apenadas consideradas de maior periculosidade, são também problemáticos. A apenada em medida de segurança em prisão comum tende a ocasionar distúrbios na unidade, pois demanda também de cuidados de saúde. Por outro lado, quando em leito psiquiátrico, além da ocupação prolongada de uma unidade de saúde, de serem comuns problemas de relacionamento com outras internas, ainda mais que usualmente as medidas de segurança ocorrem por período de 1-3 anos, e podendo se prolongar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A medida de segurança difere da atividade médica no SUS, este o qual não depende de aval ou de autorização judicial para ser exercida. A alta médica hospitalar não pode ser confundida com alvará de soltura para presidiários ou medida de segurança, pois o hospital não é uma prisão e o sistema de saúde não é parte do sistema prisional. A utilização da Lei 10216 para prender pessoas com transtornos mentais em hospitais fere os objetivos da própria Lei de proteção aos portador de transtornos mentais. Não compete aos órgãos do SUS tentarem imitar o sistema penal, nem cabe aos seus funcionários fingirem-se de agentes prisionais ou de policiais. Não cabe às ambulâncias do SUS travestirem-se em carros de segurança para transporte de apenados sob custódia de organizações penais.


REFERÊNCIAS

DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940

LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984.

LEI No 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001.