Delirium (síndrome confusional)

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INTRODUÇÃO[editar]

Derivada do latim, "estar fora de si", foi descrito por Hipócrates por volta de 460-366 a.C. <ref> [WACKER, Priscilla; NUNES, Paula V. and FORLENZA, Orestes V.. Delirium: uma perspectiva histórica. Rev. psiquiatr. clín. [online]. 2005, vol.32, n.3, pp. 97-103 . Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-60832005000300001&lng=en&nrm=iso>. ISSN 0101-6083. doi: 10.1590/S0101-60832005000300001.] </ref>. O delirium, estado de confusão mental ou síndrome orgânico cerebral aguda é uma síndrome orgânica caracterizada por alterações repentinas nas funções mentais, tais como na atenção, consciência e cognição. Portanto, dentre as distinções elementares para com os transtornos mentais gerais (não orgânicos) está no modo de início rápido, de alguma horas até poucos dias, e as alterações no nível de consciência, geralmente o paciente em delirium apresenta oscilando entre estupor, sonolência e agitação, e muitas vezes de modo contrário ao ciclo de sono vigília normal. Importante não confundir com o termo "delírio", que é uma manifestação psicopatológica de distúrbio do pensamento, caracterizado por crenças irredutíveis apesar de evidências contrárias.


FISIOPATOLOGIA[editar]

O delirium é causado pelo comprometimento transitório da atividade cerebral, este decorrente de uma doença clínica de maior gravidade, no qual há perda da homeostase cerebral. Ou seja, fisiopatologia pode ser resumida no conceito de "neurotoxicidade", quando o desequilíbrio no bom funcionamento do organismo resulta na desorganização da atividade neural, mais provavelmente relacionada a um distúrbio na neurotransmissão colinérgica. Indivíduos com certas condições clínicas e demográficas estão predispostas ao delirium, tais como: idade avançada; comprometimento cognitivo ou demência; doenças crônicas (especialmente insuficiência cardíaca, câncer e diabetes); infecção grave (como pneumonia ou infecção urinária); desnutrição ou desidratação; alterações no equilíbrio metabólico (distúrbios renais, provocados por diuréticos); pacientes pós-cirúrgicos; intoxicação ou abstinência de droga; acidente vascular cerebral; transtornos mentais.


MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS[editar]

Na CID-10 o delirium é codificado ao CID-10 F05, e são os critérios diagnósticos:<ref>[CLASSIFICAÇÃO DE TRANSTORNOS MENTAIS E DE COMPORTAMENTO DA CID-10: DESCRIÇÕES CLÍNICAS E DIRETRIZES DIAGNÓSTICAS, Coord. Organiz. Mund. da Saúde, Artes Médicas, Porto Alegre, 1993]</ref>

1. Comprometimento da consciência e atenção (em continuum de obnubilação ao coma; capacidade reduzida para dirigir, focar, sustentar e mudar a atenção).

2. Perturbação global da cognição (distorções perceptivas, ilusões e alucinações mais freqüentemente visuais; comprometimento do pensamento abstrato e compreensão, com ou sem delírios transitórios, mas tipicamente com algum grau de incoerência, comprometimento das memórias imediata e recente, mas com a memória remota relativamente intacta; desorientação temporal, assim como, em casos mais graves, espacial e pessoal);

3. Perturbações psicomotoras (hipo ou hiperatividade e mudanças imprevisíveis de uma para outra; tempo de reação aumentado; aumento ou diminuição do fluxo da fala; intensificação da reação de susto);

4. Perturbação do ciclo sono-vigília (insônia ou, em casos graves, perda total do sono ou reversão do ciclo sono-vigília; sonolência diurna; piora noturna dos sintomas; sonhos perturbadores ou pesadelos, os quais podem continuar como alucinação após o despertar);

5. Perturbações emocionais, por exemplo depressão, ansiedade ou medo, irritabilidade, euforia, apatia ou perplexidade abismada.

6. O início é usualmente rápido, o curso flutuante ao correr do dia e a duração total da condição menor que seis meses. O quadro clínico é tão característico que o diagnóstico pode ser feito mesmo que a causa subjacente não esteja completamente esclarecida.


O médico inexperiente ao avaliar o paciente com delirium pode precipitadamente atribuir a um transtorno psicótico, mas o quadro é bastante diferente, assim como o tratamento. Embora muitas psicoses podem ocorrer de forma abrupta, em geral o paciente dá sinais de alterações comportamentais prévias. Também não existe tanta desorganização nas psicoses não orgânicas como existe no delirium. Também no delirium é muito comum a "síndrome crepuscular", com o paciente tornando-se mais agitado e desorganizado ao anoitecer. E, mais importante, o médico deve se atentar para os sinais clínicos que são indicativos de delirium.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO[editar]

Sendo o delirium uma síndrome neuropsiquiátrica derivada de um transtorno orgânico, a correção deve ser na doença de base. Portanto, é fundamental identificar a doença de base para então corrigi-la. Não obstante, na maioria dos casos é preciso atuar no comportamento com medicações psicotrópicas, onde se deve ter especial atenção para não agravar o delirium. Psicotrópicos com efeito anticolinérgico, como a prometazina, e benzodiazepínicos podem agravar e prolongar a síndrome confusional. Benzodiazepínicos são bem indicados apenas são indicados em casos de delirium por abstinência ao álcool ou pelos próprios benzodiazepínicos. Em geral, as medicações de primeira linha para controle comportamental são os antipsicóticos de alta potência, mas em doses baixas. O haloperidol continua sendo medicação bastante segura para estes casos, geralmente não precisando passar de doses de 5mg/dia. Antipsicóticos atípicos, como risperidona e olanzapina também podem ser bastante indicados.

Alguns casos o maior desafio é identificar a doença de base. Uma das causas mais comuns é a infecção urinária em idosos, que muitas vezes pode não cursar com febre. Distúrbios hidroeletrolíticos também são causas muito comuns, especialmente em usuários de diuréticos, e demandam correção com suporte laboratorial. Na suspeita de evento cérebro-vascular indica-se imagem cerebral.


QUESTÕES PRÁTICAS[editar]

O delirium é agravo muito comum, especialmente em idosos, toxicômanos e paciente pós-operatórios. O paciente com delirium nas enfermarias cirúrgicas, assim como o delirium tremens típico da síndrome de abstinência ao álcool podem ser mais facilmente identificadas. No entanto, situações que o diagnóstico não realizado adequadamente pode ocasionar agravamento da doença de base, que potencialmente pode levar ao óbito do paciente. Comumente são levados às emergências gerais e emergências psiquiátricas, pacientes com delirium. Emergencista experientes identificam com frequência a cena de familiares levando o idoso que ficou confuso, buscando internação em leito terciário especializado onde não há o devido suporte clinico para o tratamento da doença de base. A equipe da emergência deve estar atenta para esta possibilidade, e muitas vezes deve manter sua posição de encaminhar o paciente para suporte clínico mesmo quando a família é contrária e quer forçar a internação psiquiátrica, pois, em última análise, é o médico quem tem o conhecimento técnico e responderá por um desfecho desfavorável. Também não é incomum aparecer casos na esfera judicial, como pedidos de "internação psiquiátrica compulsória". Neste sentido, a Lei 10.216 ao exigir o "laudo circunstanciado", garante que o paciente passe por avaliação médica, quando deverá se verificar qual a situação clínica real do paciente.