Exame Farmacogenético

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INTRODUÇÃO[editar]

A farmacogenética, o estudo de como a informação genética impacta na resposta ao fármaco e em seus efeitos colaterais, com o objetivo de fornecer tratamentos sob medida, maximizando, assim, a eficácia e a tolerabilidade.

Nos últimos anos, tem aumentado o interesse do teste farmacogenético, especialmente na Psiquiatria. Há pelo menos duas razões principais para isto: se, por um lado, se tem maiores evidências de que componentes genéticos influenciam o desenvolvimento dos transtornos mentais, por outro lado, há um grande número de pacientes que não tem boa resposta terapêutica aos primeiros ensaios farmacoterápicos. Os psicofármacos existentes, incluindo os antidepressivos (ADs), os antipsicóticos e os estabilizadores de humor (EH) não são eficazes em todos os pacientes ou produzem resposta apenas parcial, e comumente estão associados a efeitos colaterais debilitantes, que desencorajam a adesão.


FARMACOGENÉTICA PSIQUIÁTRICA[editar]

A farmacogenética psiquiátrica foi introduzida na na prevenção de toxicidade com antidepressivos tricíclicos (ADTs), pois são medicamentos claramente eficazes, mas com potencial de sérios efeitos adversos potencialmente fatais. A abordagem predominante era usar o monitoramento do nível sérico do fármaco, ao passo que foram surgindo estudos acerca das variantes genéticas que alteram o metabolismo dos fármacos tricíclicos, podendo-se identificar, assim, os pacientes sob maior risco.


Com a introdução dos ISRS, mais seguros do que os ADTs, o foco mudou para prever a eficácia. Porém, o desenvolvimento de alvos farmacogenéticos tem demonstrado tamanho de efeitos relativamente pequenos, que parte pode ser atribuído por não evidenciar diferenças em grandes estudos populacionais. Ademais, uma das limitações para uma maior aplicação de testes genéticos em pacientes psiquiátricos é a preocupação com a relação custo–benefício do teste.

Atualmente, tem se mostrado com maior interesse as variantes genéticas das enzimas metabolizadores do citocromo hepático, em especial do sistema P450. Tais indivíduos têm menor probabilidade de alcançar a remissão por um perfil de metabolismo rápido das drogas, e podem resultar em maior utilização de recursos de saúde.

Em suma, a farmacogenética em psiquiatria pode ser dividida em marcadores genéticos que predizem efeitos adversos (principalmente variantes genéticas do citocromo P450) e resposta positiva a um medicamento específico (marcadores específicos).


APLICAÇÃO NO METABOLISMO DOS FÁRMACOS - MARCADORES P450[editar]

Existem aproximadamente 60 genes relacionados ao sistema CYP450, isto é, genes que codificam proteínas envolvidas na desintoxicação de compostos exógenos ou no metabolismo fisiológico de compostos endógenos.

As proteínas P450 destinadas a compostos endógenos estão distribuídas em múltiplos tecidos, enquanto as proteínas P450 destinadas a desintoxicar compostos xenobióticos são distribuídas nos tecidos hepático e epitelial e tendem a ter mais variações genéticas. Por exemplo, a proteína 3A4 tem variabilidade reduzida, resultando em menos variantes clínicas relevantes, enquanto as proteínas 2D6 2C19 apresentam maior relevância clínica quanto às variantes genéticas.

A despeito de um grande número de variantes clinicamente significativas já identificados identificado, os fenótipos clínicos associados às variantes do P450 são divididos em:

1) metabolizadores pobres (MP);

2) metabolizadores intermediários (MI);

3) metabolizadores extensivos (ME);

4) metabolizadores ultrarrápidos (MU).

Essas variações metabólicas podem resultar em maior ou menor exposição a concentrações de fármacos. E, considerando que cada fármaco é submetida a uma via primária do CYP450, ao laudo de um teste farmacogenético será possível identificar o perfil de matabolização de determinadas substâncias.


APLICAÇÃO AOS TRANSTORNOS DO HUMOR[editar]

Após vários ensaios de ADs de diferentes categorias e/ou estratégias de combinação, aproximadamente um terço de pacientes ainda não conseguirá alcançar a remissão dos sintomas depressivos, o que pode estar relacionado a variantes genéticas no CYP450, ou mesmo em genes relacionados à neurotransmissão cerebral.

Estudos neurocientíficos já apontaram que polimorfismos no gene transportador de serotonina (5-HT), por exemplo, podem aumentar o risco de o paciente desenvolver depressão, assim como polimorfismos no comprimento de alelos podem determinar resposta a inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS). Isto é, os alelos longos podem apresentar taxas de resposta favoráveis aos ISRS, enquanto alelos curtos correspondem a taxas de resposta diminuídas aos ISRS.

Nos transtornos de humor, os testes farmacogenéticos direcionam-se às seguintes aplicações: gene SLC6AC; gene catecol-O-metiltransferase; genes codificadores de receptores da serotonina (HTR2A, HTR1A E HTR1B) e fator neurotrófico derivado do cérebro.

O gene SLC6A4 tem recebido atenção especial pois codifica a bomba de recaptação de serotonina, a mesma proteína que deve ser inibida por quase todos os antidepressivos (ADs). Estudos iniciais revelaram que indivíduos que têm a forma curta (homozigótica ou heterozigótica) do transportador de serotonina têm mais probabilidade de ficarem deprimidos no cenário de adversidades, assim como estão menos propensos a responder, ou têm uma resposta tardia, aos ADs. Além disso, esses indivíduos apresentavam maior probabilidade de sofrer de efeitos colaterais com os ADs.49

A catecol-O-metiltransferase (COMT), é a enzima que catalisa a transferência de um grupo metila da S-adenosilmetionina para as catecolaminas neurotransmissoras, dopamina, epinefrina e norepinefrina. Um polimorfismo no gene responsável pala COMT prediz resposta fraca a todos os ADs, mas particularmente aos inibidores seletivos de recaptação da serotonina/norepinefrina.

Polimorfismos nos genes responsável pela codificação de receptores serotoninérgicos HTR2A, HTR1A E HTR1B estão associados a padrão diferente de resposta ao tratamento com antidepressivos, da mesma forma que polimorfismos relacionados ao gene que codifica o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), já que é uma proteína que promove a sobrevivência neuronal.


OUTRAS APLICAÇÕES[editar]

Na psicoses, os testes genéticos podem determinar se os pacientes têm ou não predisposição a efeitos colaterais, tais como agranulocitose, com o uso da clozapina.

O polimorfismo no receptor de dopamina D2 (DRD2) está altamente associado a esquizofrenia e também à resposta antipsicótica em pacientes com esquizofrenia. Outro exemplo de achados genéticos na esquizofrenia é o alelo HTR2C, que codifica para o receptor de serotonina 2C. Variações alélicas no HTR2C, com CYP1A2 e CYP2C19, podem promover ganho de peso, dislipidemia e DM em pacientes que tomam antipsicóticos.


Há evidências de que polimorfismos da COMT e da enzima MTHFR possam estar associados a déficits cognitivos em pacientes com psicose. Há também evidências de que o polimorfismo rs6295 (indivíduos G/G) do receptor da serotonina 1A (HTR1A) está associado à melhora na cognição na terapêutica com clozapina.


CONCLUSÕES[editar]

A decisão de usar um determinado regime de tratamento farmacológico nos transtornos mentais maiores pode encontrar desafios, devido à complexidade genética, variações do metabolismo dos fármacos e outros aspectos clínicos dos pacientes (comorbidades, outras medicações). Ainda, há que se considerar o poder aquisitivo do paciente, pois não somente o custo do teste pode ser elevado (R$ 1.700,00 a R$ 4.500,00), mas também o acesso às medicações também pode ser limitada.

Não obstante, a aplicabilidade dos testes farmacogenéticos pode também ser limitada, ou seja, não tendo grande auxílio na prática clínica. Muitos dos casos de suposta "refratariedade" podem estar muito mais relacionadas a boicotes no tratamento e má adesão.

Por tais motivos, não há previsão de inclusão de testes farmacogenéticos na rede pública.


REFERÊNCIAS[editar]

Brito RB. Aplicação dos testes farmacogenéticos na psiquiatria clínica. In: Associação Brasileira de Psiquiatria; Nardi AE, Silva AG, Quevedo JL, organizadores. PROPSIQ Programa de Atualização em Psiquiatria: Ciclo 8. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2019. p. 91–124. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 4).