TDAH - Transtorno de déficit de atenção com hiperatividade
Índice
INTRODUÇÃO
O "TDAH" - Transtorno de déficit de atenção com hiperatividade, também denominado no espectro dos "transtornos hipercinéticos", começaram a ser descritos na literatura médica ainda no século XIX, embora com mudanças na nomenclatura. Na década de 1940, havia o conceito de "lesão cerebral mínima", que, na década de 1960, foi modificada para "disfunção cerebral mínima", reconhecendo-se que as alterações características da síndrome relacionam-se mais a disfunções em vias nervosas do que propriamente a lesões nas mesmas. [1]
Atualmente os sistemas principais sistemas diagnóstico e classificatórios utilizados em psiquiatria (CID- Classificação internacional das doenças, e DSM - Manual diagnóstico e estatísticos dos transtornos mentais), apresentam bastante similaridades nas diretrizes diagnósticas para o transtorno. Na CID-10 antes denominado "transtorno hipercinético", atualmente na CID-11 recebe a mesma nomenclaturas do DSV-IV e DSM-V, isto é, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade.
Os estudos nacionais e internacionais situam a prevalência do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) entre 3% e 6%, sendo realizados com crianças em idade escolar na sua maioria. Especialmente em quadros mais severos, há impacto social significativo, considerando o o estresse nas famílias, o prejuízo nas atividades acadêmicas e vocacionais, bem como efeitos negativos na autoestima das crianças e adolescentes, que apresentam um risco aumentado de desenvolverem outras enfermidades psiquiátricas.
DIAGNÓSTICO
A tríade sintomatológica clássica da síndrome caracteriza-se por desatenção, hiperatividade e impulsividade. Independentemente do sistema classificatório utilizado, as crianças com TDAH mais severa tendem a ser reconhecidas precocemente em clínicas, em escolas e em casa. A desatenção pode ser identificada pelos seguintes sintomas: dificuldade de prestar atenção a detalhes ou errar por descuido em atividades escolares e de trabalho; dificuldade para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas; parecer não escutar quando lhe dirigem a palavra; não seguir instruções e não terminar tarefas escolares, domésticas ou deveres profissionais; dificuldade em organizar tarefas e atividades; evitar, ou relutar, em envolver-se em tarefas que exijam esforço mental constante; perder coisas necessárias para tarefas ou atividades; e ser facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa e apresentar esquecimentos em atividades diárias. A hiperatividade se caracteriza pela presença freqüente das seguintes características: agitar as mãos ou os pés ou se remexer na cadeira; abandonar sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado; correr ou escalar em demasia, em situações nas quais isto é inapropriado; pela dificuldade em brincar ou envolver-se silenciosamente em atividades de lazer; estar freqüentemente "a mil" ou muitas vezes agir como se estivesse "a todo o vapor"; e falar em demasia. Os sintomas de impulsividade são: freqüentemente dar respostas precipitadas antes das perguntas terem sido concluídas; com freqüência ter dificuldade em esperar a sua vez; e freqüentemente interromper ou se meter em assuntos de outros. [2]
Para o diagnóstico do TDAH é sempre necessário contextualizar os sintomas na história de vida da criança, considerando a duração dos sintomas de desatenção e/ou de hiperatividade/impulsividade, a freqüência e intensidade dos sintomas, sua persistência dos sintomas em vários locais e ao longo do tempo, e evidências de prejuízo clinicamente significativo na vida da criança.
Normalmente, as crianças com TDAH apresentam uma história de vida desde a idade pré-escolar com a presença de sintomas, ou, pelo menos, um período de vários meses de sintomatologia intensa. Não são raras situações que sintomas de desatenção e/ou de hiperatividade/impulsividade surgem por curtos períodos (dois a três meses) claramente após um desencadeante psicossocial (por exemplo, separação dos pais), demonstrando quadro que mimetiza o TDAH mas por bases muito mais psicossociais, nos quais o foco de atenção deve ser eminentemente a psicoterapia. Ademais, sintomas de desatenção, de hiperatividade ou de impulsividade acontecem mesmo em crianças normais, uma vez ou outra ou até mesmo freqüentemente em intensidade menor. Portanto, para o diagnóstico de TDAH, a presença de vários dos sintomas de na vida da criança, assim como sua persistência em vários ambientes e manterem-se constantes ao longo do tempo. Por exemplo, sintomas que ocorrem apenas em casa ou somente na escola devem alertar o clínico para a possibilidade de que o quadro é reacional a uma situação familiar caótica ou de um sistema de ensino inadequado.
O TDAH basicamente tem três tipos: a) TDAH com predomínio de sintomas de desatenção; b) TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade; c) TDAH combinado. O tipo com predomínio de sintomas de desatenção é mais freqüente no sexo feminino e parece apresentar, conjuntamente com o tipo combinado, uma taxa mais elevada de prejuízo acadêmico. As crianças com TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade/impulsividade, por outro lado, são mais agressivas e impulsivas do que as crianças com os outros dois tipos, e tendem a apresentar altas taxas de rejeição pelos colegas e de impopularidade. Embora sintomas de conduta, de oposição e de desafio ocorram mais freqüentemente em crianças com qualquer um dos tipos de TDAH do que em crianças normais, o tipo combinado está mais fortemente associado a esses comportamentos. Além disso, o tipo combinado apresenta também um maior prejuízo no funcionamento global, quando comparado aos dois outros grupos.
Há uma taxa significativa de comorbidade entre o TDAH e os transtornos disruptivos do comportamento (transtorno de conduta e transtorno opositor desafiante), situada em torno de 30% a 50%.5, assim como com a depressão (15% a 20%), transtornos de ansiedade (em torno de 25%) e transtornos da aprendizagem (10% a 25%). Ademais, existe uma taxa maior de comorbidade entre TDAH e abuso ou dependência de drogas na adolescência e, principalmente, na idade adulta (9% a 40%).
TRATAMENTO PSICOSSOCIAL
O tratamento do TDAH envolve uma abordagem múltipla, englobando intervenções psicossociais e psicofarmacológicas.
No âmbito das intervenções psicossociais, o primeiro passo deve ser educacional, através de informações claras e precisas à família a respeito do transtorno. Muitas vezes, é necessário um programa de treinamento para os pais, a fim de que aprendam a manejar os sintomas dos filhos. É importante que eles conheçam as melhores estratégias para o auxílio de seus filhos na organização e no planejamento das atividades. Por exemplo, essas crianças precisam de um ambiente silencioso, consistente e sem maiores estímulos visuais para estudarem. Intervenções no âmbito escolar também são importantes. As intervenções escolares devem ter como foco o desempenho escolar. Nesse sentido, idealmente, as professoras deveriam ser orientadas para a necessidade de uma sala de aula bem estruturada, com poucos alunos. Rotinas diárias consistentes e ambiente escolar previsível ajudam essas crianças a manterem o controle emocional. Estratégias de ensino ativo que incorporem a atividade física com o processo de aprendizagem são fundamentais. As tarefas propostas não devem ser demasiadamente longas e necessitam ser explicadas passo a passo. É importante que o aluno com TDAH receba o máximo possível de atendimento individualizado. Ele deve ser colocado na primeira fila da sala de aula, próximo à professora e longe da janela, ou seja, em local onde ele tenha menor probabilidade de distrair-se. Muitas vezes, as crianças com TDAH precisam de reforço de conteúdo em determinadas disciplinas. Outras vezes, é necessário um acompanhamento psicopedagógico centrado na forma do aprendizado, como, por exemplo, nos aspectos ligados à organização e ao planejamento do tempo e de atividades.
Em relação às intervenções psicossociais centradas na criança ou no adolescente, a psicoterapia individual de apoio ou de orientação analítica geralmente está indicada, tanto para a abordagem de sintomas que comumente acompanham o TDAH (baixa auto-estima, dificuldade de controle de impulsos e capacidades sociais pobres) quanto para abordagem de eventuais comorbidades. A terapia cognitivo-comportamental é a modalidade mais estudada e com maior evidência científica de eficácia para os sintomas centrais do TDAH.
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
A literatura apresenta os estimulantes anfetamínicos como as medicações de primeira escolha, porém a indicação de psicofármacos para o TDAH depende também das comorbidades presentes. Há centenas de estudos controlados, bem conduzidos metodologicamente, demonstrando a eficácia dos estimulantes, mas a maioria restringe-se a meninos em idade escolar. No Brasil, o estimulante mais encontrado no mercado é o metilfenidato, cuja dose terapêutica normalmente se situa entre 20 mg/dia e 60 mg/dia (0,3 mg/kg/dia a 1 mg/kg/dia). Como a meia-vida do metilfenidato é curta, geralmente utiliza-se o esquema de duas doses por dia, uma de manhã e outra ao meio dia. Cerca de 70% dos pacientes respondem adequadamente aos estimulantes e os toleram bem. O metilfenidato, assim como outros estimulantes, não estão incluídos no SUS.
Há drogas que são colocadas como de 2a escolha, tais como os inibidores seletivos da recaptação de serotonina e os tricíclicos, que podem ser bem indicados, especialmente com comorbidades depressivas e outras. Mais de 25 estudos apontam a eficácia dos antidepressivos tricíclicos (ADT) no TDAH, a maioria também restringindo-se a crianças em idade escolar. Alguns estudos também demonstram a eficácia da bupropiona e da clonidina.
CONCLUSÕES
O transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) é uma síndrome psiquiátrica de prevalência significativa em crianças e adolescentes, apresentando critérios clínicos operacionais bem estabelecidos para o seu diagnóstico. O processo de avaliação diagnóstica é abrangente, envolvendo necessariamente a coleta de dados com os pais, com a criança e com a escola, evitando-se assim superdiagnóstico, rotulação e inadequação do tratamento. Há uma ressalva muito grande em relação ao diagnóstico do TDAH em adultos. Para tal, deve-se haver uma história pregressa consistente, não bastando relatos de que o indivíduo está com dificuldades de concentração para estudar para determinado concurso, o que obviamente revela a mera busca de um estimulante controlado. Ademais, o tratamento do TDAH envolve uma abordagem múltipla, englobando intervenções psicossociais. A abordagem psicofarmacológica atual coloca o metilfenidato como a a medicação com maior comprovação de eficácia neste transtorno, o qual não está disponível no SUS, por uma série de motivos. Em especial, por se tratar de drogas de potencial abusivo, é muito temerário a dispensação sem critérios adequados desta classe de medicamentos. O SUS fornece medicações também efetivas, tais como a fluoxetina, amitriptilina, clomipramina e nortriptilina. Ademais, o tratamento deve incluir as abordagens psicossociais, incluíndo a psicoterapia individual e as intervenções nos ambientes escolares e domésticos.
REFERÊNCIAS
- ↑ [Rohde LA, Barbosa G, Polanczyk G, Eizirik M, Rasmussen ER, Neuman RJ, et al. Factor and latent class analyses of DSM-IV ADHD symptoms in a school sample of Brazilian adolescents. (manuscrito não publicado). ** Rohde LA, Biederman J, Zimmermann H, Schmitz M, Martins S, Tramontina S. Exploring ADHD age-of-onset criterion in Brazilian adolescents. Eur Child & Adolesc Psychiatry 2000;8.]
- ↑ [Rohde LA, Barbosa G, Polanczyk G, Eizirik M, Rasmussen ER, Neuman RJ, et al. Factor and latent class analyses of DSM-IV ADHD symptoms in a school sample of Brazilian adolescents. (manuscrito não publicado). ** Rohde LA, Biederman J, Zimmermann H, Schmitz M, Martins S, Tramontina S. Exploring ADHD age-of-onset criterion in Brazilian adolescents. Eur Child & Adolesc Psychiatry 2000;8.]